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Ana Clara MeloEscritores brasileiros

Escritores brasileiros: Machado de Assis

Provavelmente o mais conhecido escritor brasileiro, Joaquim Maria Machado de Assis nasceu em 21 de junho de 1839, no Rio de Janeiro. Órfão de mãe aos 10 anos, ele foi criado pelo pai e pela madrasta. De família pobre, sua educação formal em escolas públicas foi precária. Ele nunca frequentou a universidade.

Capital do Império Brasileiro, o Rio de Janeiro consistia em uma cidade insalubre, de ruas estreitas e sem rede de esgoto. Sofria com doenças e epidemias frequentes. E como no restante do país, um dos pilares da vida social e econômica era a escravidão.

Machado dispunha, no entanto, de um grande interesse pela literatura e pelos livros. Mulato, bisneto de escravos, epiléptico e gago, em criança ele foi vendedor de balas e sacristão da Igreja Nossa Senhora da Lampadosa, uma irmandade negra, na Avenida Passos, no Centro da cidade.

Se, em função de sua origem, Machado não encontrou caminha na educação formal, compensou tal limitação enquanto um brilhante autodidata. Cedo demonstra interesse literário. Os próprios esforços o levariam a galgar uma trajetória distinta daquela esperada de alguém de pele escura em um centro escravista.

Aos 17 anos, Machado de Assis conseguiu um emprego como aprendiz de tipógrafo e revisor na Imprensa Nacional. Lá, conheceu outro escritor brasileiro, Manuel Antônio de Almeida, que o suportaria no caminho da escrita, e passou a frequentar rodas literárias e do teatro cariocas.

Os relacionamentos travados no período o levaram ao jornalismo, no jornal Correio Mercantil, do Rio de Janeiro. Também escreveu folhetins para peças de teatro, críticas de teatro, artigos jornalísticos, contos e textos em outros veículos impressos. Em 1867, por indicação do Imperador Dom Pedro II, Machado é indicado a um cargo no Diário Oficial.

Ele se casaria com a irmã de um amigo, Carolina Augusta Xavier de Novais, em 1869. Apesar de uma vida conjugal harmônica, não tiveram filhos.

O primeiro livro publicado por Machado de Assis foi de poesias, de título 'Crisálidas', em 1864. A coletânea 'Contos Fluminenses', de 1870, mesmo sem grande sucesso comercial, fez notar sua voz entre críticos e o meio literário da época.

O primeiro romance veio em 1872, quando ele contava com 33 anos. No ano seguinte, Machado de Assis assumiu um cargo no serviço público da Secretaria de Estado do Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Até o fim de sua vida, o serviço público serviria como sua principal fonte de renda.

Duas fases


A crítica literária usualmente divide a produção literária de Machado de Assis em duas fases. Considera-se o divisor de águas a publicação do romance 'Memórias Póstumas de Brás Cubas', em 1881.

Os livros da primeira fase, abrangendo poesias, contos e romances, caracterizam-se por uma, aproximação maior com estilos literários da época, entre eles o romantismo. Incluem-se aqui os livros 'A mão e a luva', de 1874, e 'Helena', de 1876. É a partir de 'Memórias Póstumas de Brás Cubas' que Machado de Assis elabora obras de maior inovação, complexidade e profundidade.

Da segunda fase também constam os livros 'Quincas Borba', de 1891, e 'Dom Casmurro', de 1899, além de livros com alguns de seus melhores contos. Foi por meio das obras de sua segunda fase que Machado de Assis se alçou à condição de um dos principais escritores da história da literatura em língua portuguesa e mundial.

No mesmo ano em que perdeu a esposa, em 1904, Machado publicou o romance 'Esaú e Jacó'. A ele seguiram-se 'Relíquias de Casa Velha', em 1906, e 'Memorial de Aires', em 1907.

Abatido por solidão e tristeza sem a esposa, e por agravamento de problemas de saúde que o afligiam desde a juventude, Machado de Assis faleceu em casa, em 1908, aos 69 anos de idade.
Duas cores

Desde a morte do autor, a cor da pele de Machado de Assis foi alterada. Contemporâneos, como Joaquim Nabuco ou Humberto de Campos, atestavam que ele era mulato de sangue, com a cor da pele escura.

Todavia, em sua certidão de óbito consta a cor 'branca'. E nas décadas seguintes, Machado foi retratado como um escritor branco, em vez de mulato. Essa mudança, segundo estudos acadêmicos, refletiria a preferência de uma sociedade escravocrata para a cor daquele eleito como o escritor brasileiro mais relevante da época.

Existe também um debate a respeito da posição de Machado de Assis frente à escravidão e ao racismo. Ele manteve uma posição distanciada do tema, que borbulhava durante o período com a luta pela abolição da escravatura, que tinha José do Patrocínio como um de seus líderes.

Ao mesmo tempo, talvez como estratégia de inserção social, Machado estabeleceu uma rede de relacionamentos preferencialmente com membros da elite branca carioca, como livreiros, políticos, escritores e servidores públicos. É frequentando esses círculos e cultivando tais relações que vai se legitimando na elite cultural a reputação do escritor.

E é essa mesma elite branca que ele faz de protagonista em seus livros. Em sua literatura, apagou qualquer vestígio de sua história pessoal e das condições brutais da sociedade escravocrata da época.

Por outro lado, há quem argumente que Machado não se absteve de abordar o tema. A seu modo, explorando a ironia e a dissimulação. Em suas obras, o escritor expôs de modo crítico a elite branca que o cercava.

Além disso, o tema da escravidão esteve presente, ainda que jamais de forma panfletária ou de engajamento político, em crônicas, contos, romances e poemas de todas as fases da vida de Machado.

Não deixa de ser um fato memorável que, em país regido por uma elite branca, escravocrata e eugenista, um mulato, descendente de africanos, tenha se alçado à condição de principal referência literária nacional.




Por Ana Clara Melo
Crítica Literária

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