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Ana Clara MeloEscritores brasileiros

Escritoras brasileiras: Clarice Linspector

Fotografia de Clarice Linspector
Existe uma dívida literária do Brasil com a Ucrânia. Por causa de uma mulher: Clarice Lispector. Nascida em 10 de dezembro de 1920, na cidade de Chechelnyk, na Ucrânia, ela imigrou carregada no colo. Os pais fugiam da perseguição aos judeus, desencadeada na Ucrânia durante a Guerra Civil Russa.

Foi essa a dádiva ucraniana. De nome original Haya, ao chegar no país a criança ganhou outro, Clarice, transformando-se na brasileira que se tornaria uma das maiores referências da literatura de língua portuguesa.

Da Ucrânia, a família Linspector se mudou, em 1922, para Maceió, em Alagoas. Depois, em 1924, estabeleceram-se em Recife, Pernambuco. Clarice era a caçula de três filhas. A mãe sofria de uma doença, que ia progressivamente paralisando o corpo, e demandava os cuidados da filha mais velha. Faleceu quando Clarice tinha 8 anos de idade.

Em 1935, a família Linspector se transferiu para o Rio de Janeiro. Clarice concluiu o curso ginasial, realizando faculdade de direito, profissão que não seguiria. Passou a frequentar a redação de jornais em busca de oportunidades. A perseverança deu efeito e Clarice iniciou a carreira no jornalismo no mesmo ano do falecimento do pai, em 1940.

A profissão a aproximou de outros escritores e do meio literário. Em 1943, aos 22 anos de idade, ela publicou "Perto do Coração Selvagem", seu primeiro romance, de grande repercussão devido às suas inovações, como a fragmentação da linearidade temporal e a exploração do mundo psicológico.

O manuscrito do romance fora apresentado a uma das maiores editoras do país à época, a José Olympio, sendo rejeitado por seu editor, Álvaro Lins. Mas através do relacionamento com amigos, saiu a primeira edição do livro, uma tiragem de 1.000 exemplares, recebendo a autora, como pagamento, 100 livros.

O preconceito existente contra as mulheres figuraria na crítica do livo publicada, em 1944, por Álvaro Lins no jornal "Correio da Manhã". Segundo ele, "uma característica da literatura feminina é a presença muito visível e ostensiva da personalidade da autora logo no primeiro plano. É certo que, de modo geral, toda obra literária deve ser a expressão, a revelação de uma personalidade. Há, porém, nos temperamentos masculinos, uma maior tendência para fazer do autor uma figura escondida por detrás das suas criações (…). Logo se vê que as mulheres estão inclinadas de modo especial para essas formas literárias que permitem projeções mais diretas e sensíveis das suas personalidades."

O romance, entretanto, veria uma forte recepção no meio literário, reconhecimento consolidado quando a obra recebeu o prêmio nacional "Graça Aranha".

O segundo romance, "Lustres", viria à público três anos depois. Clarice havia casado com o diplomata Maury Gurgel Valente e, entre 1944 e 1960, teve residência fora do país, na Europa e nos Estados Unidos, período em nasceram dois filhos. Escreveu contos e crônicas, que saíam por jornais brasileiros, e publicou "A cidade sitiada" em 1946.

Separou-se do marido e da vida de diplomacia em 1959, regressando ao Rio de Janeiro com os manuscritos do livro de contos "Laços de família", publicado em 1960, e do romance "A maça no escuro", publicado em 1961. Viveu do trabalho junto a jornais e revistas, escrevendo críticas, crônicas, contos.

O romance "A Paixão Segundo G.H.", de 1964, um dos mais relevantes, elevou definitivamente Clarice Linspector a uma voz imprescindível da literatura nacional. A protagonista do romance, G.H., é uma mulher que experimenta uma profunda experiência pessoal ao se deparar com uma barata em seu apartamento. O livro navega pelos pensamentos e emoções da personagem frente ao encontro tão banal.

Várias outras obras ainda seriam publicadas, entre elas "Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres", de 1969, e "A Hora da Estrela", de 1977, além de outros livros de contos, crônicas e infantis.

Quando Clarice foi hospitalizada e submetida a uma cirurgia, em 1977, os médicos detectaram um câncer de ovário. Irreversível. Fulminante. Ela faleceu pouco depois.




Por Ana Clara Melo
Crítica Literária

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